Acordamos com a voz de um senhor lendo com dificuldades uma de nossas frases. Era um senhor baiano que dizia ser catador de lixo, comentou que iria ao tribunal questionar o porque de não ter recebido ainda o seu dinheiro de uma sentença favorável a ele. E o pior é que o tribunal estava em greve. Este senhor se chama Joaquim Araújo Mendes, fez questão de falar nome e sobrenome. Aparentava ter mais de cinquenta anos, muito magro, com apenas dois terços dos dentes na boca usando uma camisa surrada com a bandeira do Chile. Ele ficou eufórico com a ideia da Democracia Real e queria levar um dos ” frutos” da Árvore do Conhecimento, pois ele queria divulgar na cidade dele. Ficamos com dó de tirar um dos “frutos”, que até então eram poucos. Mas como negar? Porém na hora que fomos arrancar, Joaquim mudou de ideia: “Não arranca não, deixa para outros lerem, é importante”. Seu Joaquim levou anotado o endereço do site da democracia real e do nosso blog com a promessa que iria divulgar na sua cidade.
Falando da nossa árvore, agora ela esta com bastantes frutos, melhorou bastante, mas pode melhorar mais. Para colocar os papéis estava faltando barbante, um morador do Mofuce( parece que eu escrevi errado da outra) que estava no acampamento disse que tinha um rolo de barbante sobrando e tambem um fogareiro, então fomos para o Mofuce buscar essas doações. Chegando lá, encontramos Julio,outro morador do Mofuce. Ele nos convidou para comer um frango que ele estava fritando. Recusamos, pois tínhamos que colocar os novos frutos na árvore do conhecimento antes de começar o Sarau. Mas Julio não desistiu: ” Voces vieram aqui somente pra buscar o fogueiro e o barbante, isto é apenas utilitarismo, isso é o que o sistema propõe. Aqui no Mofusa isto não existe, gostamos da convivência, da conversa, da relação direta do ser humano”. Alegamos que estávamos sem tempo, mas Julio não desistiu: ” Kant e posteriormente Einstein disseram que o tempo é apenas uma ilusão, vocês não lutam pra sair da ilusão do sistema? Então não podem ficar escravo do tempo, até porque eu estou oferecendo um frango bem apetitoso”. Não teve como negar depois desses argumentos, Julio tinha uma história de vida bem interessante e sua inteligência era rara. Ele argumentava emendando uma teoria na outra, uma citação atrás de outra, numa rapidez que exigia de nós, seres com cérebros normais, concentração total para não se perder na linha de raciocínio dele. Fim do Jantar agradecemos ao Julio e fomos para o Sarau
O grupo Vira Lata chegou as 20:30 para iniciar o Sarau, foi uma experiência incrível, o mais motivador é que as poesias estavam no contexto do nosso acampamento, é muito bom ver que a arte está acompanhando o porcesso de mudança. Momento que arrepiou a todos foi quando um dos integrantes recitou a a letra do rap ” Jesus Chorou” e quase todas as pessoas presentes cantaram junto.
No fim fizemos uma assembleia para acertar futuras operações. Ponto positivo que deve ser destacado é que o campamento hoje estava cheio.
Amanhã no feriado terá debates, apareçam galera, todos que estão aqui relatam que são outras pessoas depois do acampamento.
Sarau na Praça da Assembléia
Hoje tem Sarau na Praça da Assembleia.
Às 20:30 o grupo os Vira-Latas fazem sarau no corete da praça da assembleia em BH.
Participe do Sarau e conheça o #OcupaBH.
Mais informações: http://poesiaviralata.wordpress.com/
Debate em 30/out/2011
Este debate teve início a partir da discussão da idéia, surgida da nossa já estabelecida árvore do conhecimento, de criação de uma árvore da denúncia. Alguns debatedores se mostraram contrários à iniciativa, por considerá-la muito ligada à luta contra a corrupção e à crítica aos nossos governantes – movimento já cooptado por setores conservadores com voz em publicações como a revista Veja – e não ao questionamento do sistema representativo em si, um dos eixos da nossa proposta. O viés mais ligado ao denuncismo, amplamente difundido na população já há muitas gerações, só tem levado à esperança de que algum dia a classe política adquira uma consciência de que deve trabalhar para a maioria e não para interesses particulares de alguns poucos. Esta conscientização, a partir da pressão popular, seria supostamente suficiente para promover uma mudança no país sem a necessidade de se adotar uma forma completamente nova de sistema de decisão. Continuar a ler
Diário de Ocupação – 16º dia
Hoje vou começar o relato a partir da madrugada de domingo pra segunda, pois assim que acabei de postar o diário de ontem, iniciou uma chuva fortíssima, ao qual exigiu da gente uma reestruturação de última hora do acampamento. ” São Pedro esta aliado ao sistema”. Esta foi a nossa conclusão, na verdade as palavras foram mais pesadas, mas vou ameniza-las para poupar seus ouvidos, ou melhor, suas retinas. O “segurança” que ficava nos observando finalmente foi embora, não vai deixar saudades. Aguentar chuva e frio é somente para quem tem uma ideia, só pelo dinheiro uma hora a pessoa irá desistir.
Na parte do dia criamos lixeira para coleta seletiva, a Assembléia se gaba com alguns folhetos internos sobre procedimentos de sustentabilidade que a casa toma, mas vocês acreditam que não existe nenhuma lixeira de coleta seletiva na praça?
Fizemos contato com o pessoal da comunidade Dandara para realizarmos um debate sobre habitação, eles demonstraram muito interesse e que na quarta responderiam. O contato com o duelo de MC’s também foi feito, para finalizar o debate ao som do hip hop engajado.
Marcamos um Sarau para amanhã as 20:30 no coreto da praça (São Pedro, se você atrapalhar desta vez não vou amenizar as palavras, tudo o que for dito sobre você será escrito na íntegra).
Fiquei sabendo que a revista Carta Capital escreveu uma matéria criticando a Veja por tentar associar o Anonymous com a direita, mas não consegui achar essa matéria na internet. Seria bom alguem posta-la aqui. Mas ao procurar a matéria vi muitos blogs e revistas repudiando a atitude da Veja, creio eu que conseguimos virar o jogo.
Vi posts no face sobre o a frustação, em tom de cobrança, sobre a falta de apoio ao acampamento. Não condeno quem o faça, até acho que existe utilidade nisso. Mas eu não gosto muito de reclamar sobre isso. Pois pra mim o comprometimento, a participação tem que ser espontâneo, natural, sem pressão ou culpa. Confesso que me frusta também a pouca evolução no sentido de apoio nesses 16 dias iniciais. Mas é de cada um avaliar se acha que o 15-O vale a pena perder um pouco de assistri a sua TV, de dormir um dia fora da sua cama, de deixar de ir num bar. Temos que ter plena consciencia dos motivos que nos trazem para a ocupação. Mas mesmo sem cobrar, tenho que deixar claro que não sei até quando o acampamento vai durar se o apoio não aumentar. Estou esperançoso, na verdade confiante, pois acredito que se colocarmos nossas ideias em prática, o quorum irá aumentar consideravelmente. Podemos estabelecer um novo parâmetro de discussão e construção na ´populaçaõ de BH, realizar um momento histórico. Você realmente vai querer ficar de fora dessa? Quando seu filho te perguntar sobre esse 15-O que ocorreu em 2011 você vai dizer que ficou em casa?
Conhecimento Salva!
Diário de Ocupação – 15º dia
Domingo de sol pela manhã e novamente a praça está lotada de famílias. Muita gente apareceu dizendo que leu a reportagem que saiu no jornal, e procurando a tal Árvore do Conhecimento que foi citada na matéria. Pena que nossa árvore está com apenas quatro frutos. Mas amanhã ou no máximo terça terá mais dezenove, mas por favor gente, não vamos parar nesse número, é só pegar um papel, citar um texto, um poema, uma informação, uma gravura, o que você achar interessante e plastificar. Hoje nós mudamos a placa da árvore, substituímos a cartolina que estava desgastada pela chuva por uma madeira pintada. Novos integrantes apareceram, inclusive do interior, mas para um domingo o quorum hoje foi baixo. Debates espontâneos aconteceram o tempo todo e mais a noite foi realizado um programado. Foi discutido um assunto que se iniciou no debate do dia anterior: como seria a transição da democracia representativa para a Democracia Real? Foi um assunto muito polêmico. É possível através do sistema fazer essa transição? Ou apenas com a moblização em massa e a desobediencia civil podemos reverter esse quadro? Debatemos também a necessidade de termos uma agenda com pelo menos duas semanas de antecedência, pois é essencial para a divulgação. Vamos também montar uma biblioteca aberta para todos, assim como divulgar nas escolas a árvore do conhecimento e pedir que cada uma elabore um texto para ser mais um fruto. Completamos meio mês de ocupação e hoje foi um dia de reflexão, de auto-crítica. Temos que agilizar a produtividade, fazer a nossa ideia de transformar a praça num centro cultural vingar. A partir disso sempre me perguntam: “O que vocês estão precisando para fazer isso?”. A resposta é bem simples, precisamos de GENTE! Hoje recebemos mais doações de comida, até um sorvete rolou ( que saudade eu estava de tomar um sorvete), mas aumentar o quorum é mais necessário no momento. Quanto a reportagem do Estado de Minas, encontramos duas coisas que claramente foram propositais. A primeira, o uso do termo “apoliticos”. O prefixo “a” se refere a negação, por acaso nós negamos a política? Apartidário e apolíticos são coisas diferentes. A segunda coisa foi a insistência de nos rotular de classe média, chegando ao ponto de dizer: “apesar de terem dinheiro as condições da acampada são precárias”. Enfim, deixo para cada um interpretar, mas se vocês discordaram de algo, vamos encher a caixa de e-mail do repórter. Criamos hoje nosso blog: ocupabh.wordpress.com , o diario agora será postado lá também. Já estava esquecendo, Hoje trouxeram um boneco de pano com o rosto do Sarney, será que é uma boa ideia deixar ele ficar na ronda?
Matéria – Estado de Minas 29/10
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Jovens ocupam praça da Assembleia para protestar
Jovens universitários de classe média ignoram o simbolismo das estátuas de Ulysses, Tancredo e Teotônio Vilela e acampam em frente à Assembleia para contestar a democracia representativa
Leonardo Augusto -
Se as estátuas de Ulysses Guimarães, Teotônio Vilela e Tancredo Neves na Praça da Assembleia, Zona Sul de Belo Horizonte, ouvissem, enxergassem e falassem, pediriam hoje para serem levadas de lá. Há duas semanas “convivem” com cerca de 20 jovens que, inspirados em movimentos populares do Norte da África e Europa, montaram um acampamento na praça que funciona como uma espécie de central para debate e contestação da democracia representativa, sistema que os três políticos ajudaram a reimplantar e a consolidar no país depois de 21 anos de ditadura militar.
A maioria universitários de classe média, os acampados da Praça da Assembleia integram movimentos como o Anonymous e o Take the Square (tome a praça), que surgiram na internet. O Anonymous começou como um grupo de hackers que ficaram famosos por usar máscaras que imitam o rosto do soldado inglês católico Guy Fawkes, que teve participação na tentativa fracassada de assassinar o rei protestante Jaime I em 1605. Fora qualquer conotação histórica, o mote de esconder faces e nomes serve para tentar enfatizar exclusivamente as causas que defendem.
O Take a Square mantém até site com orientações sobre como ocupar praças. O movimento começou em Madri em 15 de maio e se expandiu para outras capitais europeias e para a América do Norte. Em Nova York, tomou parte do centro financeiro do país, no que ficou conhecido como Occupy Wall Street.
Os acampados da Praça da Assembleia se declaram sem qualquer ligação partidária e “apolíticos”. “Acreditamos que pertencer a uma legenda não seja o caminho. Queremos que a sociedade tenha poderes para definir seu próprio rumo”, afirma Max Viana, 23 anos, estudante de engenharia civil com bolsa paga pelo governo federal. “Não tenho problema nenhum com isso. A União é obrigada a dar educação para o povo”, argumenta.
A escolha da Praça da Assembleia não foi à toa. Além de estar próxima à sede do Poder Legislativo, fica a poucos metros do edifício do Banco Central na capital mineira. Além de defender a democracia direta, os acampados protestam contra o capitalismo. Em uma árvore ao lado das oito barracas que armaram na praça penduraram cartazes com reclamações sobre o sistema. “A vontade e o propósito do nosso sistema atual são a acumulação de dinheiro e o crescimento econômico como fins em si mesmos. A enganação de que nosso bem-estar estaria indiretamente garantido à medida que grandes corporações atingissem esses objetivos não nos convence mais”, diz um dos textos pendurados ao que chamaram de “árvore do conhecimento”.
Regras claras
Para os que já começaram a imaginar que os acampados querem mesmo é bagunça, como às vezes ocorre em um ajuntamento de jovens fora de casa, a história é outra. Uma série de regras precisam ser seguidas por quem pretende participar do movimento. É proibido bebida alcoólica ou qualquer outro tipo de drogas, além de cigarro dentro das barracas e sexo.
Com estrutura precária, apesar das boas condições financeiras, os acampados mantêm na praça, além das barracas e colchões, apenas um galão de água. A comida ou é comprada em restaurantes próximos, que cobram preços mais baixos, ou vem da casa de simpatizantes. “Outro dia um senhor nos trouxe chocolate quente”, conta Max. Copos e pratos são lavados nas casas de amigos que moram próximo.
Há um revezamento no acampamento. Nem todos os manifestantes dormem na praça todos os dias. O advogado que se identifica pelo nome de Legião – por ser do movimento Anonymous o rapaz, de 29 anos, se recusa a dizer o nome verdadeiro – alterna noites na barraca com outras na casa dos pais, a poucos metros da praça, no Bairro Santo Agostinho. “Ainda não sei como vamos fazer para mudar tudo. O importante no momento é organizar a sociedade. Nosso lema no mundo é ‘não nos representem’. Em outros países o movimento está mais organizado. Em novembro, por exemplo, o povo vai discutir nas praças da Europa a taxação de 1% aos bancos para combate à pobreza”, informa Legião.