Folha de São Paulo, 23 de janeiro de 1985
Fiel Transcrição:
Micro-eletrônica
sai à caça da espionagem.

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No arsenal do contra-espião,
itens como micro-transmissores e aparelhos anti-grampo. O grego naturalizado Georges P. Sellinas e alguns dos
equipamentos apreendidos no Brasil. |
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JOÃO ROBERTO LAQUE
Especial para a Folha Informática
Se o seu telefone anda com zumbidos esquisitos, seu
travesseiro deu pra conversar à noite ou sua secretária, apesar de muito bonita,
inteligente e eficiente, nunca pediu aumento, desconfie. Você pode estar sendo espionado.
Neste caso, a melhor saída é contratar um contra-espião, que com seus
micro-transmissores, pílulas receptoras ingeríveis, desgrampeadores e toda uma
parafernália eletrônica, acabará por desmascarar o inimigo.
Apesar de ser crime previsto no Código Penal, artigo 151,
com pena de três anos de reclusão, a espionagem vem atingindo níveis assombrosos no
Brasil. De acordo com a AIS (Associação Internacional de Segurança), atualmente são
mais de trezentos mil espiões atuando no País, apoiados logicamente por cerca de
cinquenta mil indústrias clandestinas do ramo.
No Brasil, a única empresa especializada em combater
os atos de espionagem é a Secretel Serviço de Inteligência Científica
Ltda., que atende pelo telefone 274-6262 e que é dirigida pelo grego
naturalizado brasileiro, Georges Panayote Sellinas, um
engenheiro mecânico de 59 anos que esteve no Serviço de Inteligência na Segunda Guerra
e depois operou nos grandes centros de radares da OTAN (Organização do Tratado do
Atlântico Norte) na Grécia e na Turquia. Sellinas explica que "a espionagem já
superou em muito a ficção científica". Por isso, os equipamentos que utiliza na
contra-espionagem, que ele chama de "combate ao crime científico", tem que ser
de primeira linha tecnológica.
Para detectar aparelhos, como um micro-transmissor
encontrado por ele numa multinacional com capacidade para enviar as conversas de um
diretor via satélite para qualquer parte do mundo, Sellinas conta com um incrível
arsenal.
São pílulas receptoras, dotadas de bateria e antena,
ingeríveis, micro-transmissores menores que a cabeça de um prego, |
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indetectáveis detectores de espiões eletrônicos, escutas que captam conversas em
ambientes mesmo com o telefone desligado e muitos
outros instrumentos, alguns irreveláveis que colocariam qualquer James Bond no chinelo.
Custo Elevado
Caso você se considere um espionado em potencial, os
preços deste ramo de negócio não são nada módicos. O próprio Sellinas explica que
"o custo é elevado, porque dependa da elaboração de um plano de ação e de equipamento
de alta precisão. Mas a eficiência acaba compensando". Dar uma referência de
preço para este tipo de serviço é muito difícil. Os orçamentos variam da caso para
caso.
A detectação de aparelhos da escuta, que no
"espionês" chama-se "varredura", custaria de saída duas ORTNs por
metros de piso. Assim, por exemplo, uma sala de três por seis metros, desde que não
tenha nenhum revestimento especial ou outras complicações, custaria, por baixo, Cr$ 900
mil.
A busca de espiões em linhas telefônicas, anulando
o famoso "grampo", custaria, também no mínimo, Cr$ l milhão. Porém não
desanime. Sellinas explica que dependendo do cliente e das condições, esse custo cai
bastante e o serviço pode sair bem mais barato. "Antes de desistir o melhor é fazer
um orçamento".
Para quem não está disposto a contratar um
profissional, existe o método "seja um contra-espião você mesmo". Nesse caso,
a Ibranovi do Brasil Telecomunicações, do mesmo grupo da Secretel,
que atende pelo telefone 215-5199, tem à venda uma série de equipamentos de extrema
utilidade.
Por Cr$ 600 mil você poderá comprar um
micro-interceptador (pouco menor que uma caixa de fósforo) para gravar conversações,
com Cr$ l milhão um micro-transmissor eletrônico e por Cr$ 2,8 milhões um "de
bug", aparelho para paralisar qualquer tipo de mecanismo espião colocado na linha de
seu telefone. Quem quiser sofisticar pode comprar um equipamento telefônico com um
"de bug" embutido e muitas outras novidades. |
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O Estado de São Paulo, 18 de março de
1984
Fiel Transcrição:

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Sellinas, o
contra-espião da história. |
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No poste elétrico
(esquerda), o gravador é ligado à linha telefônica, que Sellinas detecta no seu
aparelho (a direita). |
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Se o engenheiro Georges
Sellinas não existisse, certamente o trabalho dos detetives particulares seria muito mais
fácil. Considerado o "inimigo nº l" dos grampeadores, segundo dizem, os detetives. São muito bem articulados entre si, formando uma
verdadeira "quadrilha". "Inúmeros deles conseguiram infiltrar-se em
diversos setores policiais para conseguir informações e segredos de colegas envolvidos
em alguma espécie de crime." E
acrescenta: "Toda vez que circula na polícia alguma desconfiança contra algum de
seus colegas e antes que este receba convite para depor, eles já estão sabendo,
alertados por gente da própria polícia. É o pagamento de "reciprocidade"
pelos serviços que fazem para policiais amigos. O engenheiro acusa o presidente da
Associação Profissional dos Detetives Particulares de São Paulo Aprodepesp
, Carlos Alberto Sant'anna de proteger grampeadores e de ser "caloteiro", não pagando os
detetives que contrata.
Outra acusação de Sellinas: "as agências
quando estão sem serviço, espalham, seus agentes pela cidade para espionar pessoas que
possam estar cometendo adultério". Segundo ele, os detetives Investigam uma região
e determinadas residências, pagando empregados domésticos por informações sobre seus
patrões. Depois, começam a perseguir suas vítimas até conseguir fotografá-las em
flagrante, O passo seguinte, segundo Sellinas, é chantageá-las, cobrando multo dinheiro
para não revelar seus casos amorosos.
Presidente da Associação Profissional dos Detetives
Particulares do Estado de São Paulo Aprodepesp , há pouco mais de um ano,
Carlos Alberto Sant'anna quer mais respeito com a categoria. Ele admite que "há multa
bandalheira no setor", mas garante que os detetives estão trabalhando honestamente.
"Tudo o que existe de ruim dentro da categoria é culpa das autoridades, que não
combatem o contrabando de material de escuta telefônica."
Com 18 anos de profissão, Sant'anna é representante
de uma parcela de uma categoria extremamente
dividida. Nem os próprios detetives gabem quantas entidades de classe existem atualmente.
Certamente, segundo ele, há pelo menos mais de uma dezena.
No começo do ano passado Sant'anna disputou a presidência
da Associação com outro detetive, J. Amaral, candidato derrotado a deputado estadual
defendendo o PTB, assumindo o cargo ocupado por Ultemberg Silveira Marques, acusado de
apropriação indébita, danos morais, materiais. Sant'anna diz que quer moralizar a
categoria e logo no início de sua gestão tratou de afastar nada menos que 2.123 associados
que estavam em situação administrativa e profissional |
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Irregulares.
Amaral não teve dúvidas: fundou outra
associação. Sem uma
legislação específica que regulamente a profissão os detetives particulares
formam uma categoria confusa que, segundo Sant'anna, precisa ser respeitada principalmente
pela polícia. É freqüente a prisão de detetives. Nesses casos, conforme Sant'anna, a
entidade movimenta-se rapidamente para libertar o associado.
Mas nem mesmo a polícia e os problemas internos da
categoria parecem ser maiores que as dificuldades impostas pelo "inimigo n° l"
dos detetives, Georges Sellinas. "Ele" diz Sant'anna "tem a
proteção da Polícia Federal. Manda seguir os detetives para entregá-los á polícia e
depois dizer que seu trabalho, é de contra-espionagem. E uma concorrência desleal.
Quando sei que ele está sabendo que existe algum grampo, peço para o pessoal não
retirar o gravador. É melhor perder o equipamento do que ser preso em flagrante".
Barros
Ex-comerciante, ex-balconista, ex-corretor da bolsa
de valores, técnico em eletrônica, o detetive particular Francisco de Assis Barros é o
maior grampeador de telefones de São Paulo. As agências pagam o que ele pedir por seus
serviços porque cabem que dificilmente seus grampos serão descobertos. "Pra mim,
não tem mistério afirma com ar de triunfo. Censuro qualquer coisa
telefone, sala, quarto, cozinha, banheiro, o que for necessário. O importante é
satisfazer o cliente."
Detetive há nove anos, esse paraibano miúdo nascido
em Campina Grande, ar esperto e que gostava de ler as aventuras de Sherlok Holmes quando
criança, fabrica seus próprios equipamentos eletrônicos e acha que em seu campo
profissional "há lugar para todos".
"Eu não faço censura telefônica", diz.
"Eu gravo conversa", usando a eletrônica como melo de investigação. Isso é
diferente. Uma vez consegui convencer um juiz de que não havia cometido crime, explicando
que ainda não havia escutado as fitas e que, portanto, não estava censurando ninguém. E
me livrei porque o crime ficou somente na tentativa." Com vários inquéritos sobre
interceptação telefônica para responder e um passivo de 13 dias de prisão no antigo
Dops por causa de uma "campana" (vigilância) malfeita, Barros confessa que tem
multo boas ligações em empresas públicas e na polícia, para quem já tez vários
trabalhos.
Para conseguir as informações de que precisa,
Barros faz de tudo. Diz que possui uniformes de várias empresas, usa disfarces e até
invade domicílios, se for o caso. "Isso só é crime se alguém me pegar",
argumenta. O detetive acrescenta que tem amigos em todos os lugares, mas não perdoa
Sellinas. |
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